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Crítica | Fora de Série (Booksmart)

Amy (Kaitlyn Dever, Short Term 12) e Molly (Beanie Feldstein, Lady Bird) são duas garotas extremamente esforçadas que durante o ensino médio focaram somente nos estudos, para assim poderem passar nas universidades de seus sonhos. Ao descobrirem que os outros alunos também entraram em ótimas universidades, mesmo tendo se divertido durante o colégio, as duas decidem usar sua última noite antes da graduação para recuperar o tempo perdido e se divertir como deveriam mas nunca fizeram.

O filme marca a estreia na direção da diretora Olivia Wilde, que já dirigiu apenas curtas e vídeos musicais. O filme não conta com cortes e quadros revolucionários mas fica claro que Wilde sabe o que está fazendo, que se preparou para esse trabalho e espero que ela continue a dirigir. Ela fez uma ótimo trabalho, não somente atrás das câmeras como também na relação que criou com os atores e seu profissionalismo no set de gravação. Os atores já deram várias declarações de como ela foi brilhante não só como diretora mas como apoiava todo mundo, do elenco aos funcionários do set, com uma energia muito positiva, que escutava as ideias e queria que os atores se sentissem seguros e confiantes.

Seu estilo nos aproxima da história e dos personagens, com close-ups em momentos sérios e planos abertos que dão a ambientação em cenas mais leves. Seu modo de filmar cria uma conexão entre espectador e personagem que não muitos diretores conseguem fazer, principalmente na primeira vez atrás da câmera. Ela já trabalhou com vários diretores e se inspirou nessas experiências para seu filme, por exemplo, Martin Scorsese não quer que os atores carreguem o script no set de gravação, isso faz com que eles tenham que ter absolutamente todas as falas decoradas (o que parece fácil e óbvio pra um ator mas não é, uma olhadinha no script sempre ajuda naquele momento de nervoso antes de uma cena). No caso desse filme isso ajudou Olivia e os atores, que além de não terem acesso às suas falas o tempo todo lhes deu liberdade para improvisar algumas cenas, o que é ótimo para um filme de comédia e que geralmente rende muitos momentos que acabam no filme.

O filme fala muito bem sobre como não devemos julgar as pessoas ao nosso redor mas também não deveríamos julgar a nós mesmos. As preocupações dos personagens são bem exploradas, sem cair em estereótipos que estamos cansados de ver e sabemos exatamente o que farão.

Temos muitos personagens secundários e todos, simplesmente todos, fazem a diferença nesse filme. Eles são bem usados e suas presenças fazem a diferença na histórias das duas principais, mostrando como estamos rodeados de pessoas extremamente diferente e que por mais que achamos que as conhecemos (e que temos o direito de julgá-las) nós não a conhecemos intimamente, e elas podem nos surpreender, assim como nós podemos surpreendê-las.

Várias cenas do filme têm um toque especial que marcam a direção e escolhas de Wilde, mostrando porque ela foi a pessoa perfeita pra dirigir esse filme. Logo no começo, antes de ir pra escola, as duas estão dançando na rua e podemos ouvir no fundo uma música animada. Olivia decidiu tirar a música de repente e deixar as duas personagens dançando no meio da rua sem som nenhum. Eu gostei muito dessa escolha afinal é o que realmente está acontecendo. Músicas de fundo são adicionadas para que nós que estamos assistindo possamos nos entreter com aquele momento, mas pra deixar a cena mais realista, e acaba ficando mais engraçada, a falta do som deixou a cena bem melhor, com duas garotas fazendo o robozinho no meio da rua.

Em outra cena, mais pro final do filme, temos uma discussão entre as duas amigas. Aqui acontece o contrário, não temos o diálogo mas só a música de fundo. Isso deixou a cena muito mais intensa e sentimental, pois deu liberdade ao espectador de se colocar no lugar das personagens e imaginar o que seria dito naquele momento. Nós não precisamos ouvir essa conversa, é um momento que deve ser entre as duas e cause uma sensação de que deveríamos sair dali e deixá-las sozinhas. As duas claramente estão dizendo coisas negativas e com raiva e isso nos faz lembrar de brigas que tivemos com pessoas que nos importávamos, não necessariamente lembrando o que foi dito mas como aquela discussão causou um impacto em você.

Uma cena que gostei muito é entre Amy e Hope, quando as duas estão se beijando e começam a se despir no banheiro. Foi a perfeita representação do que realmente acontece nessa hora. Olivia revelou em uma entrevista (x) que queria que as duas atrizes se sentissem seguras durante a gravação. Ela já gravou várias cenas íntimas e sabia como são desconfortáveis e que muitas vezes os atores se sentem expostos mais do que deveriam, mesmo sendo seu trabalho mas que o ambiente é ameaçador e expositivo sem necessidade. Ela fechou o set e deu prioridade pra privacidade do momento, ela desligou os outros monitores e apenas algumas pessoas ficaram durante a gravação. Ela também queria que a cena fosse mais realista, com as personagens parando pra respirar durante o beijo e a dificuldade de tirar o tênis e uma calça jeans, e como a primeira vez também é sobre navegar nesses momentos complicados, sem a sexualização que vemos atualmente em cenas íntimas.

Amy é lésbica e o filme trata isso de modo maravilhoso. Em qualquer outro filme de adolescentes nós teríamos duas garotas indo atrás do mesmo garoto, ou as duas se odiando por um motivo besta ou como uma delas é homossexual teríamos piadinhas e comentários como “pera, você tá dando em cima de mim? Agora que sei que você é gay eu não sei se você tá flertando ou não” e esse filme trata a sexualidade e a amizade feminina de um modo maravilhoso e respeitoso. As duas são amigas e se apoiam mais do que tudo, quando uma conversa sobre um crush começa, Molly incentiva Amy a ir atrás da garota que gosta, como qualquer uma de nós faríamos como nossas amigas. Sem desrespeito, sem tensão, simplesmente uma amizade entre duas adolescentes como deveria ser.

Uma cena diferente de tudo que já tinha visto é quando elas usam drogas sem querer e alucinam que são barbies. Segundo Wilde, as duas super feministas viraram a manifestação literal da patriarquia: peitos grandes, cintura fina, mal conseguem andar mas se sentem bonitas apesar disso tudo. (x)

Fora de Série é aquele filme feel good que a gente ama e que sempre vai lembrar, pelo enredo que faz a gente se conectar com as personagens e acabar reavaliando algumas decisões que tomamos e como podemos ser melhores, para focar no futuro mas também aproveitar o hoje.

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